Nesta Europa, Portugal poderá voltar a crescer a sério?

16 mai, 2014 • Joana Costa

"Muito dificilmente", responde o economista José Reis. Sem contas equilibradas não há "crescimento sustentável", contrapõe Cantiga Esteves. Portugal diz adeus à troika, mas as regras do Pacto Orçamental Europeu definem uma "austeridade permanente"?

Nesta Europa, Portugal poderá voltar a crescer a sério?

“Muito dificilmente” Portugal terá hipótese de crescer economicamente com as regras do Pacto Orçamental Europeu, que “resfriam a economia”. O aviso é do director da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), José Reis.

Com um imperativo de ter um défice estrutural inferior a 0,5% do PIB e uma dívida pública que não deve ultrapassar os 60%, o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, também conhecido por Pacto Orçamental Europeu, é exequível?

“É exequível”, responde o economista José Reis. Mas pode “ser exequível para o nosso mal”.

O economista está a quilómetros de distância da posição de Cantiga Esteves, professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG).

“Sem sustentabilidade podemos aguentar uns tempos, mas a prazo não temos solução. Esta falta de adaptação às realidades é perturbante na Europa”, defende o também economista.

José Reis discorda. “[O pacto] Significa uma situação regressiva, de austeridade, de punição dos rendimentos, de recondução dos portugueses a nível de vida e de bem-estar muito inferior ao que tínhamos direito. Significa uma austeridade permanente, um acentuar das desigualdades.”

As regras europeias – que provocaram até divisões no PS – significam uma outra coisa “que nunca aconteceu na economia portuguesa”, critica: “níveis de desemprego absolutamente elevados e insuportáveis em que todos, obviamente, poderemos viver, mas viveremos tristes, mal e, sobretudo, de forma injusta.”

A argumentação não convence Cantiga Esteves. Sem contas equilibradas não há “crescimento sustentável” da economia, sustenta.

“Isto é uma coisa que a Europa tem de uma vez por todas de perceber e entender que o normal é viver com finanças equilibradas. Não podemos ter sistematicamente défices orçamentais”, defende.

Mudanças na UE
Apesar das divergências, os dois economistas estão de acordo: a Europa não vai bem. Mas discordam nas causas.

“Eu concordo que a Europa tem problemas complicados, mas tem-nos por não ter contas equilibradas. A Europa proporcionou aos seus cidadãos todo um conjunto de regalias fantásticas, mas que estamos a verificar que não são sustentáveis”, explica Cantiga Esteves.

Já para José Reis, “a Europa está imersa num período longo de estagnação, devido à forma como governou a economia, como desregulou os mercados financeiros”, entre outros factores.

Neste cenário, o director da FEUC defende como “melhor caminho” uma revisão radical de toda a arquitectura institucional europeia.

“A Europa precisava de nos oferecer uma alteração radical. O tratado orçamental vai no sentido inverso. Seria necessário, em primeiro lugar, uma revisão de tudo o que tem a ver com as finanças públicas, precisávamos de um orçamento europeu.”

Saída do euro é “um disparate”
José Reis e Cantiga Esteves defendem a manutenção de Portugal na moeda única.

“O que eu imagino é que a convergência de posições é ainda mais difícil em Portugal do que no quadro europeu. Por isso, continuo a privilegiar o quadro europeu como solução, sabendo o estado lamentável em que está a Europa”, afirma José Reis.

Cantiga Esteves adianta duas razões “perversas” para a saída da moeda única: fazer moeda sem economia real e ganhar competitividade através da desvalorização cambial.

Ora, defende, “isso é um disparate”. “A maior ficção criada nos últimos tempos foi a crise do euro. Há crise das dívidas soberanas, dos vários países. O euro continua a ser a moeda mais forte que há.”