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Contribuinte escreve ao provedor de Justiça a explicar porque não paga impostos

02 abr, 2013

"Decidi hierarquizar as minhas obrigações: primeiro dar de comer aos meus filhos e a mim, depois pagar serviços, renda da casa e no fim os impostos", justifica à Renascença Alcides Santos.

Contribuinte escreve ao provedor de Justiça a explicar porque não paga impostos
Um desempregado entregou esta terça-feira uma carta na Provedoria de Justiça a defender a legitimidade de não pagar impostos, invocando o direito ao trabalho e à resistência, consignados na Constituição. Alcides Santos tinha já contado a sua história à Renascença em Novembro. Agora que ficou sem subsídio de desemprego decidiu "hierarquizar" as suas obrigações e, "tal como o Governo decide pagar primeiro aos credores", colocou a alimentação e a renda da casa como prioritárias.
O provedor de Justiça, Alfredo de Sousa, recebeu esta terça-feira uma carta de um gestor de sistemas informáticos que invoca o artigo 21º da Constituição para anunciar que vai deixar de pagar impostos. À Renascença, Alcides Santos, desempregado há dois anos, alega que acima dos seus deveres como contribuinte está o dever de não deixar os filhos passar fome.

"Decidi hierarquizar as minhas obrigações: primeiro dar de comer aos meus filhos, a mim e aos meus pais, depois pagar serviços, renda da casa e no fim os impostos", diz. "Da mesma forma que o Governo decide pagar primeiro a credores, deixando crianças com fome e velhos morrer porque não conseguem pagar os medicamentos, também tomo as minhas decisões", justifica.

Na sua exposição ao provedor de Justiça, o gestor informático revela que não vai pagar IMI pela casa onde habita, nem IRS e IVA sobre um serviço que fez há alguns meses. Questionado sobre o que espera após a entrega da carta, anseia por compreensão: "O Estado, como é uma pessoa de bem, vai entender que o que digo faz todo sentido. Acredito que vão dizer que 'as pessoas que estiverem na situação deste senhor não pagam impostos'".

Em declarações à Renascença, o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia chama a atenção para o "facto de a Constituição e o direito fiscal já acomodarem algumas situações em que os contribuintes se encontram numa situação de pobreza", pelo que a norma constitucional referida por Alcides Santos não pode ser usada para não pagar impostos.  Ainda assim, Jorge Bacelar Gouveia considera que este caso "é interessante" e que "deve ser analisado".


[notícia actualizada às 16h53]