Dúvidas Públicas

Turismo conta fechar 2024 com receita recorde de 27 mil milhões, três anos antes do previsto

13 jan, 2024 - 12:17 • Sandra Afonso , Arsénio Reis

Depois de anunciar resultados históricos no último ano, o presidente do Turismo de Portugal admite na Renascença que 2024 ainda será melhor. Em entrevista ao programa Dúvidas Públicas, Carlos Abade fala ainda de salários, da falta de mão-de-obra, de taxas, do alojamento local, do aeroporto de Lisboa e do turismo que Portugal tem hoje para oferecer.

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Turismo conta fechar 2024 com recorde de 27 mil milhões em receitas
Turismo conta fechar 2024 com recorde de 27 mil milhões em receitas

Aquele que é hoje um dos motores da economia nacional promete continuar a puxar pelo crescimento do país. Menos de uma semana depois de serem conhecidas as receitas históricas de 2023, em que o setor ultrapassou os 25 mil milhões de euros, o presidente do Turismo de Portugal admite agora antecipar em três anos a meta traçada para 2027.

No entanto, o setor mais pujante do país também tem espinhos. As empresas já recuperaram da pandemia e até estão a subir salários, mas ainda há quem pague mal. Em entrevista ao Dúvidas Públicas, o novo programa semanal da Renascença, Carlos Abade diz que este ano os aumentos mantêm-se acima da média nacional, até porque continua a faltar mão-de-obra no setor.

Há 28 anos no Turismo de Portugal, mas apenas há seis meses na liderança, Carlos Abade não comenta a avaliação da Comissão Independente para o novo aeroporto de Lisboa, mas defende “uma urgência ponderada com a inteligência da decisão”. Não se pronuncia sobre as alterações ao alojamento local, mas diz que é preciso “uma gestão inteligente das cidades e do território”, não opina sobre o crescimento das taxas turísticas, mas lembra que devem “compensar a vida das pessoas e dos residentes”.

Nesta viagem rápida por um setor também ele em rápido crescimento, passamos ainda pelas novas apostas da área, os mercados que falta atrair e os desafios do espaço virtual. Fechamos com música, uma escolha exclusiva do entrevistado, que nos lembra porque há bandas que são e serão intemporais.

Entrou em 1996 para o Turismo de Portugal, agora lidera esta estrutura. Tantos anos depois, quando assumiu a presidência ainda foi confrontado com alguma surpresa?

Claro que sim. Estamos a falar de 28 anos, é muito tempo, e ver aquilo que era o turismo em 1995, quando entrei no então Fundo do Turismo, e no que é hoje, a dimensão é completamente diferente. É uma realidade completamente diferente.

Hoje o turismo é o motor da economia nacional, tem uma importância enorme. Aliás, os números apontam no final deste ano para receitas turísticas que vão chegar aos 25 mil milhões de euros, o que significa um desafio para a organização, para a equipa e também um desafio para mim, pessoal.

As contas de 2023 ainda não estão completamente fechadas, mas tudo aponta para o melhor ano de sempre do turismo: um recorde de 77 milhões de dormidas, 25 mil milhões de receitas. Como é que explica estes resultados, apesar das incertezas no plano económico, da perda de poder de compra e até das tensões geopolíticas?

Não é o trabalho de um ano, é o trabalho de muitos anos, de muita gente a fazer muitas coisas boas, durante muito tempo. Estou a falar das empresas, que têm aqui um papel essencial porque são os motores da criação de valor, mas também das entidades públicas e de uma parceria enorme. Aliás, se existe uma parceria público-pública, pública-privada ou privada-privada, que de facto teve sucesso, é esta do turismo, fez com todos estivessem alinhados num objetivo comum.

Claro que Portugal depois tem atributos que fazem com que seja hoje, de acordo com dados de 2019, o 12.º destino turístico mais competitivo do mundo. Significa que o turismo está a crescer mundialmente e Portugal tem capacidades competitivas para competir com qualquer outro país e está na linha da frente daquilo que é a captação de mercado.

E cresce acima do turismo mundial ou dentro de uma certa normalidade?

Cresce acima. Do ponto de vista do turismo mundial, está previsto que em 2023 tenham sido recuperados os índices de 2019, em 90 a 95%. Ora, Portugal já tinha em 2022 ultrapassado as receitas de 2019.

O turismo também tem promovido a divergência entre regiões, com diferentes ritmos de crescimento. No entanto, em 2023 o Norte, Centro e Alentejo cresceram mais. Pode ter sido um ano de viragem, o que está a mudar?

O que está a mudar é precisamente o objetivo, que também está associado à estratégia do setor - continuar a crescer de uma forma inteligente, sustentável e responsável, ao longo de todo o ano e de todo o território. Significa que o país não são só as regiões mais tradicionais do ponto de vista da atração turística, o país tem recursos extraordinários no interior.

Há políticas direcionada para promover e reforçar os territórios do interior. É também por isso que o turismo é tão bom para o país e para as pessoas, porque é o motor daquilo que pode ser a coesão económica e social. Estamos a criar condições para que haja negócios no interior, para que haja pessoas a trabalhar, para que haja atração de pessoas para o interior.

Quantos postos de trabalho foram criados no interior no último ano?

Não tenho esse número. Posso dizer que em 2023 os postos de trabalho criados no setor do turismo já são superiores aos de 2019. É evidente que, com o crescimento que tem ocorrido mais nas zonas do interior, também os postos de trabalho no interior têm crescido a uma taxa superior.

Houve um interregno, de qualquer forma, com a pandemia. Chegou a dizer que em 2020 o turismo recuou 26 anos em hóspedes e dez anos em valor. Como é que está a situação financeira das empresas do setor neste pós-pandemia? Já recuperaram?

Quando se diz que recua 26 anos em dormidas e dez anos em valor, significa que o setor do turismo tem feito um caminho de valorização da própria atividade. Hoje o mercado é fruto da prospeção e diversificação de mercados, nomeadamente nos Estados Unidos e Canadá. Significa que o setor está cada vez mais resiliente às crises e tem cada vez maior capacidade de crescimento em valor.

Claro que as empresas do setor em 2020 e 2021 tiveram perdas muito significativas, mas também é verdade que nos anos que antecederam evoluíram muito, do ponto de vista daquilo que é a sua estrutura financeira. Quando chegámos a 2020 estavam muito melhor do em 2008.

Mas, ainda assim, houve apoios, houve recurso ao crédito.

(A pandemia) Quase fechou o setor, quase fechou o turismo, com perdas muito avultadas. Naturalmente que houve medidas de política pública, particularmente importantes - apoios financeiros como moratórias no pagamento dos créditos à banca, nos impostos - que associados à capacidade que as empresas tinham, permitiu retomar 2022 como queríamos: mantendo os ativos e com o mínimo de perdas de postos de trabalho. E arrancámos muito mais depressa do que aquilo que na altura se previa.

Em 2021, quando fizemos as projeções para o crescimento nos próximos anos, até 2027, prevíamos que poderíamos atingir em 2027 os 27 mil milhões de euros de receitas turísticas.

Estamos nos 25 mil milhões em 2023.

Exatamente. O arranque de 2022 e depois a continuação em 2023, veio demonstrar que as empresas conseguiram preservar os seus ativos, a sua capacidade de gestão e, ainda assim, os postos de trabalho, o que permitiu constituir equipas para levar em diante este processo de recuperação, que é um dos mais rápidos e mais sustentado.

Diria então que as empresas já recuperaram efetivamente?

Do ponto de vista da exploração, claro que recuperaram. É evidente que ainda estarão a recuperar dos resultados líquidos negativos que tiveram que registar nas contas e tiveram impacto nos balanços em 2020 e 2021.

Tendo em conta os novos recordes de receitas, já atingidos e previstos, a meta dos 27 mil milhões será atingida mais cedo?

Tudo indica que sim. Todos os indicadores relativamente a 2024 indicam que o setor vai continuar a crescer: reservas, capacidade aérea, procura do destino, os orçamentos das empresas para este ano.

Pode acontecer que em 2024 estejamos, pelo menos, muito perto daquilo que era o objetivo de 2027. Não podemos hoje, estamos no início de janeiro, falar de quais serão as percentagens de crescimento. O crescimento ocorrerá e ficaremos muito perto daquilo que é o objetivo para 2027. O que significa que 2024 será também um ano para refletirmos, ponderarmos e apontarmos, provavelmente, novas metas para o futuro.

Uma antecipação de três anos, portanto?

Uma antecipação de três anos.

Com todos estes resultados, como é que se justifica a manutenção dos baixos salários neste setor?

Temos de ver isto em perspetiva. Quando olhamos para o que tem sido o percurso dos salários nos últimos anos, 2021 a 2023, aquilo que percecionamos é que os salários estão a aumentar a uma percentagem superior à percentagem de aumento de salários na economia normal.

Qual é o salário médio no turismo?

O turismo tem várias atividades e não podemos retirar da dimensão do salário tudo o que depois vem como subsídios, muitos deles associados à própria atividade. E muitas vezes falamos da remuneração base e essa comparação pode não ser justa.

O que os dados apontam é que a média dos salários no turismo, em determinadas atividades económicas, é inferior à média nacional. Mas o que estamos a constatar agora é que as empresas têm feito um esforço no sentido de incrementar esse aumento. Está a aumentar mais do que a média nacional, num sentido da convergência.

É claro que não estamos satisfeitos. Achamos que existe espaço, quer para as empresas crescerem, porque para a distribuição de riqueza é necessário que a riqueza seja criada, quer para continuarmos a crescer naquilo que é a retribuição dos trabalhadores, que verdadeiramente são eles que depois fazem a criação de valor.

E a escassez de mão-de-obra, continua a ser um dos principais problemas?

Continua a ser, de facto, um problema. Neste momento o setor do turismo já ultrapassou os números de postos de trabalho de 2019. Contudo, a verdade é que as necessidades também têm aumentado, o que significa que continua a haver escassez de mão de obra. Também por isso, teria de haver aqui um percurso de aumento da retribuição dos trabalhadores, para ir ao encontro das necessidades das empresas.

Temos estado a trabalhar, articuladamente com a Confederação do Turismo e associações empresariais, no sentido de captar mão de obra para o turismo, numa lógica de valorização e dignificação dos profissionais, com uma trajetória de crescimento na carreira.

Procuram mão-de-obra mais ou menos qualificada, são mais chefes de cozinha ou mais camareiras? Do que é que o turismo hoje mais precisa para se continuar a desenvolver a este ritmo?

O turismo precisa, praticamente, de pessoas e de mão de obra para todas as categorias profissionais. Porque, quando há expansão e ampliação da capacidade produtiva, todo ele aumenta.

Há regiões que estão a aumentar as restrições ao turismo, Veneza é um exemplo. Por cá, um estudo recente da European Business School diz que a maioria dos residentes do Porto defende limitações ao turismo, porque inflaciona os preços. Teme um aumento da oposição ao setor?

O turismo é bom na exata medida em que for bom para as pessoas, é bom porque é uma fonte de riqueza enorme para o país. Sem turismo, o país seria mais pobre. Quando falamos daquelas receitas turísticas de 25 mil milhões de euros não são receitas gastas exclusivamente no setor do turismo. Aliás, a maior parte nem sequer é gasta em atividades turísticas, porque quando o turista vem cá, não consome só em hotéis e restaurantes.

O turismo é importante porque também alavanca outros setores de atividade, que com certeza não conseguiriam exportar aos preços que exportam se não fosse o incremento da notoriedade da imagem de Portugal que o turismo ajudou a criar. Hoje, se há muitas artes e ofícios que ainda se mantêm, se ainda há o esforço de apoio à cultura, muito também se deve ao turismo.

É evidente que temos de estar atentos à pressão da procura e perceber, exatamente, o que podemos fazer em cada momento. Isso tem a ver com a gestão inteligente que temos que fazer cada vez mais nas cidades, nos territórios. Nesse estudo que refere, a esmagadora maioria das pessoas também veem contributos positivos no turismo.

Temos de trabalhar em articulação com as autarquias, as empresas, os agentes locais e ser cada vez mais eficientes na gestão.

Veneza pondera limitar os grupos que entram na cidade, por exemplo, e vai cobrar "bilhete de entrada". Em Portugal, há algum destino que já obriga a antecipar medidas deste tipo? Estão pensadas?

Não. Veneza, relativamente à pressão da procura, tem especificidades que só se aplicam ali, não se aplicam a nenhuma cidade de Portugal. O que existe aqui é uma necessidade de fazermos uma gestão cada vez mais inteligente das cidades.

As cidades hoje são cada vez mais globais, são para os residentes, para quem visita, para aqueles que vêm trabalhar, para aqueles que vêm estudar. São cidades cada vez mais dinâmicas.

Esta gestão inteligente não foi aplicada no alojamento local? O que falhou, para ser tão criticado?

Não creio que tenha falhado nada em especial. A criação desse instrumento foi uma forma de legalização de uma dimensão que existia e que não estava na economia. Foi um processo.

O alojamento local foi particularmente importante e continua a ser na regeneração das cidades, requalificação e reabilitação e tem um papel fundamental naquilo que é o turismo nacional. Uma parte muito significativa das dormidas ocorre no alojamento local.

Na perspetiva do turismo, as alterações ao modelo de alojamento local foram positivas ou negativas?

Essas medidas foram aprovadas pelo governo no contexto de uma preocupação muito específica que teve a ver com a dimensão da habitação. O Governo considerou que fixar alguns limites para a dimensão de um segmento local podia incrementar a dimensão da habitação, que é um fator de emergência social. É a leitura que fazemos sobre as medidas que foram tomadas.

Mas pode prejudicar o setor?

O alojamento local que existia ontem a funcionar é o alojamento local que existe hoje, não foram retiradas licenças.

Mas não cresceu.

Estamos a falar em determinados locais, não em todo o país. Significa que podemos continuar a crescer em todo o país, mesmo na dimensão do alojamento local. Agora, algumas áreas, sim, com algumas limitações.

O turista que nos visita hoje é particularmente diferente, diria eu, daquele que vinha ao país há 20 ou 30 anos. É mais exigente? O que é que procura?

Tem a ver muito também com o que tem sido a estratégia do setor. O mercado norte americano lidera hoje em Lisboa, o que não acontecia há uns anos. No Porto, se não estou em erro, é o terceiro.

Houve uma alteração e tem havido uma diversificação de mercados que só vem tornar o setor cada vez mais forte e o mercado mais valioso. Cada turista que vem, em média, tem um acréscimo de valor relativamente àquilo que era no passado.

Claro que isto implica exigências maiores. Aquilo que foi pedido ao setor foi que evoluísse na cadeia de valor, que tivesse propostas cada vez mais sofisticadas, cada vez mais diferenciadas, cada vez mais inovadoras, para ir ao encontro de um turista cada vez mais exigente.

Em Portugal sempre falámos muito do turismo de sol e praia, mas já não é só isso que o turista procura?

Exatamente. Nós temos trabalhado muito produtos que começam a entrar em determinados segmentos de mercado. Por exemplo, estamos a trabalhar o turismo literário, o turismo industrial, a própria gastronomia, a forma como ela se trabalha, o enoturismo. Hoje, o enoturismo em Portugal é o segundo mercado mais competitivo do mundo e isso implicou trabalhar do ponto de vista da oferta, da promoção, dos mercados e passámos a ter a capacidade de receber procura cada vez mais exigente.

Estes novos produtos vão ao encontro da necessidade de segmentos de mercado mais específicos, normalmente de maior valor acrescentado. Por exemplo, tivemos há pouco tempo no Financial Times Weekend, em Londres, onde levámos precisamente turismo de literatura, gastronomia e vinhos.

Onde é que Portugal é mais forte neste momento, em que tipo de turismo?

Nós, evidentemente, que continuamos a ser muito fortes no sol e mar, Aliás, o Algarve é o melhor destino europeu de sol e mar, quanto a essa matéria não há dúvidas.

Mas é evidente que temos outras dimensões. O turismo de natureza, tudo aquilo que tem a ver com a gastronomia, o enoturismo, a visitação das cidades. Temos as cidades mais inteligentes, ainda que tenhamos que prosseguir ainda este caminho. Estamos hoje a trabalhar muito a dimensão do turismo militar, o sacro walking (percursos por igrejas e mosteiros).

Qual é a expressão do turismo religioso?

É bastante significativa. É verdade que tem um foco grande em Fátima, mas de facto há mercados, por exemplo a Coreia do Sul, a Polónia, que procuram muito essa dimensão. Também tem uma expressão bastante significativa na oferta de produtos em Portugal.

A nova campanha promocional do Turismo Portugal aposta na sustentabilidade, naquilo que se chama turismo responsável. É porque temos oferta, como dizia, ou porque está na moda e era inevitável seguir esse caminho?

Não está na moda, é mesmo estrutural. Aliás, já tínhamos definido em 2017 que esse era o caminho do setor do turismo: evoluirmos e termos sempre presente a dimensão da sustentabilidade ambiental social e económica.

Considerámos também importante lançar esta campanha porque é uma mensagem universal, que convoca todos para este desafio da sustentabilidade. Não é só as empresas, as organizações, quem aqui vive, é também quem nos visita.

Em Portugal várias localidades vão passar este ano a cobrar taxa turística, como Viana do Castelo e Portimão, outras já cobravam e vão aumentar o valor. Depois ainda temos as taxas aeroportuárias. São taxas e taxinhas... é este o caminho que defende para o turismo?

Não vou comentar as taxas turísticas em si mesmo. Os municípios têm essa capacidade e fixarão em função daquilo que entendem. O que é importante é perceber que as taxas têm associada uma certa compensação dos locais pela fruição que é feita por parte dos turistas.

Mas não é para isso que servem também as receitas?

As receitas servem para fazer face às despesas de cada uma das entidades. As taxas são uma compensação relativamente ao impacto que o turismo possa ter nos locais e devem ser fixadas de forma equilibrada, para que não coloque em causa a competitividade dos destinos. A sua aplicação deverá ser orientada para compensar ou para fazer algumas iniciativas e ações que visem de facto compensar a vida das pessoas e dos residentes.

Acha que é isso que acontece na maioria dos municípios que cobram taxas? Ou seja, são aplicadas na recuperação de património ou de outros equipamentos?

Daquilo que eu conheço, sim. Mas temos que ter essa atenção.

Não haveria outra forma de cobrar esse valor, menos intrusiva e impositiva?

Acontece em todos os destinos, é uma questão que não é de Portugal. É uma realidade.

Durante os primeiros nove meses de 2023, últimos dados conhecidos, os aeroportos do Porto, de Lisboa e de Faro registaram máximos históricos no movimento de passageiros. O que é que se espera para este ano? Novos recordes?

Sim. Olhamos para 2024 e percebemos que aquilo que é procura do destino de Portugal, aquilo que são as reservas, as conversas que temos tido com os operadores, tudo aponta no sentido do crescimento. Significa, naturalmente, que esses números, do ponto de vista de chegadas aos aeroportos, muito provavelmente em 2024, temos novos recordes.

Há 50 anos que andamos a discutir as limitações da Portela e a queda do Governo voltou a adiar uma decisão. Se lhe pedisse uma estimativa do que é que perde o turismo nacional com esta indecisão, tinha um número para me dar?

Não tenho um número para lhe dar, mas mesmo com a dimensão e com as limitações que a infraestrutura aeroportuária de Lisboa tem, e tem bastantes, o Aeroporto de Lisboa cresceu em número passageiros 7,7%, face a face ao ano passado.

Há margem de crescimento do número de passageiros que podem chegar no mesmo avião e tem que se gerir que tipo de avião chega. Nós temos de trabalhar para tornar cada vez mais eficiente aquilo que temos, porque não vamos ter o aeroporto de Lisboa amanhã.

Teve oportunidade para ler o relatório da Comissão Independente. Na sua opinião, qual é que será a melhor solução para o novo aeroporto?

Sobre essa matéria não vamos emitir uma opinião. Aquilo que é importante e aquilo que desejamos é que tudo seja devidamente ponderado e que haja uma decisão o mais depressa possível para que o mais depressa possível a solução esteja no terreno e possa ser construída.

Não há nenhuma solução que se adeque mais a essa urgência de que falava, como o Montijo?

A urgência tem de ser ponderada com a inteligência da decisão. Não é uma urgência a todo o custo, é a urgência dentro daquilo que é uma decisão inteligente para um problema que se arrasta há 50 anos e que tem de ser decidido.

Neste momento, a nossa preocupação é, face às limitações que existem, encontrar as melhores soluções para continuar a incrementar a capacidade aérea para Portugal. Nós temos vindo a desenvolver determinados programas de aceleração com startups, no sentido de encontrar soluções que se possam aplicar aos aeroportos e que possam torná-los mais eficientes para que consigamos continuar a crescer.

O país beneficia pelo facto de ter uma companhia aérea de bandeira? Que impacto é que pode ter no turismo a privatização da TAP?

O turismo claramente que beneficia. Este caminho de diversificação de mercados, nomeadamente para o mercado dos Estados Unidos, Brasil ou Canadá, isso muito se deveu ao trabalho que foi feito pela TAP.

Isso pode ficar em risco com a privatização?

Espero bem que não.

O que posso dizer é que a TAP tem tido aqui um papel importantíssimo. Enquanto a TAP tiver no nome Portugal, naturalmente que há aqui uma dimensão estratégica que não pode deixar de ter e de prosseguir.

Portugal é o terceiro país da Europa com mais voos atrasados ou cancelados, segundo dados divulgados pela AirHelp. O Turismo Portugal já teve alguma iniciativa, nomeadamente junto da Ana, para tentar perceber se estes problemas podem vir a ser melhorados?

Sim. Temos estado a trabalhar com todos os parceiros e todos os atores para perceber de que forma é que o Turismo de Portugal pode ajudar - sendo certo que, de facto, quem gere as infraestruturas não é o Turismo de Portugal - no sentido de encontrar melhores soluções para que não haja tantos atrasos.

Acredita que essas soluções vão dar resultados no curto-médio prazo?

As soluções vão sendo encontradas e têm de integrar quem gere os aeroportos, quem gere as companhias aéreas, temos que trabalhar com todos os parceiros.

Olhando para o dinheiro gasto pelos turistas em Portugal, os britânicos lideram esta tabela, seguidos dos espanhóis, alemães, franceses e norte americanos. São dados 2022 do INE. Quais são os destinos que gostaria de atrair e ainda não conseguiu?

O mercado do Reino Unido continua a ser o nosso maior mercado. Continuamos a expandir para o mercado nos Estados Unidos. O Canadá e o Brasil também são mercados muito importantes. Aliás, não conseguimos recuperar no Brasil os números de 2019, em 2024 temos uma oportunidade de crescer no mercado do Brasil, mas também do outro lado, nos mercados asiáticos (China, Coreia do Sul), mas também do Japão, da Austrália.

São dimensões relativamente às quais temos uma particular atenção, porque percebemos que há ali uma procura potencial para Portugal, que também já existe e que é muito significativa. Temos depois que preparar também a nossa oferta para esse tipo de mercado, nomeadamente, o mercado chinês, que tem determinado tipo de características e de exigências.

Olhando para 2024, o turismo é um dos poucos setores que cumpre um plano estratégico, definido até 2027. O sucesso do turismo também se prende com a existência desta estratégia? É uma coisa que os portugueses são muito acusados de nunca ter.

O turismo tem uma estratégia desde 2017 e foi aprovada em articulação com todos os parceiros do setor. O objetivo é que Portugal continue sempre a crescer de uma forma inteligente, responsável e sustentável, no sentido de se tornar um dos destinos mais competitivos e sustentáveis do mundo. O facto de existir uma estratégia acaba por ser muito positivo porque também delimita, por exemplo, a promoção turística de Portugal. De certa forma, há uma confluência de recursos.

Um dos grandes desafios é continuar a crescer em valor e a bater recordes sucessivos. Como é que pretende fazer isto?

O crescimento das receitas será tão melhor atingido quanto melhor nós conseguimos entrar em mercados de maior valor acrescentado. Por outro lado, há uma dimensão interna, que é a criação de riqueza a partir dessas receitas, isso significa alargar margens. Basicamente, significa serem mais eficientes, mais inovadores, mais diferenciadores, mais investimento em sustentabilidade, redução de custos e mais qualificação dos profissionais.

Faltam apoios nesse caminho, nomeadamente, no âmbito do PRR? Há medidas concretas previstas para apoiar esse crescimento do turismo?

Há medidas concretas. No âmbito PRR existe uma agenda do turismo com cerca de 150 milhões de euros, que apoia um conjunto de projetos que são considerados estruturantes para introduzir no setor uma dimensão de inovação grande. Para além disso, existe apoio financeiro quer no âmbito do PT 20/30, quer no âmbito de linhas próprias do Turismo de Portugal.

Só conseguimos crescer se continuarmos a investir e se continuarmos a investir bem, com inteligência. E para boas decisões de investimento, sim, existem de facto bons instrumentos de apoio financeiro.

Este é um ano de eleições em Portugal. Prefere a continuidade ou a mudança?

Não me vou pronunciar sobre essa matéria. O turismo tem tido uma grande estabilidade ao longo dos anos e isso também tem contribuído para o crescimento. As linhas de orientação estratégica que têm vindo a ser produzidas têm sido ganhadoras, não vejo razões para que possam ser alteradas. Podem ser melhoradas e revistas em função da realidade.

Segundo o INE, a despesa anual média das famílias portuguesas em lazer, cultura, restaurantes e hotéis está a diminuir desde 2005. Que medidas que estão pensadas para inverter esta tendência?

O mercado nacional é particularmente importante para o setor, vale 30% do mercado total. O que temos vindo a fazer é valorizar o mercado nacional através do apoio a produtos que visem essa captação e também passar a mensagem aos portugueses que Portugal ainda tem muito para conhecer e que ainda podem ser muito surpreendidos se optarem por visitar Portugal.

Há cada vez mais adeptos do turismo virtual - ir para fora sem sair do lugar. Isto é uma ameaça ou uma oportunidade?

Eu diria que não é uma ameaça, porque as pessoas podem tentar procurar os sítios no sentido virtual do termo, mas provavelmente ficarão apaixonadas e quererão visitar. Eu diria que é mais uma oportunidade para mostrar às pessoas o quão bom é poder estar nos sítios.

Nada substitui a presença física. Podemos contactar as pessoas, a cultura, os costumes. Isso irá potenciar as necessidades e motivar as visitas.

No início dizia que é um amante de música e dizia que canta bem o fado. Confirma?

Dizem que sim. (risos)

Tendo o gosto pela música, pedimos-lhe que escolhesse uma das músicas da sua vida.

Eu gosto particularmente de música. Aliás, não passo nenhum dia sem estar pelo menos uma hora, hora e meia, a ouvir música. Faço isso há anos e de forma muito diversificada, tanto gosto de ouvir Bach e Wagner, como os Coldplay, Frank Sinatra ou Elvis.

Mas há duas bandas que me acompanharam toda a vida, os Pink Floyd e os Dire Straits, também têm a ver, no fundo, com a minha geração. Considerei interessante trazer aqui uma música dos Dire Straits que, não sendo das mais conhecidas tem uma coisa extraordinária que é um solo de saxofone incontornável do ponto de vista musical e inesquecível. Aliás, muitas vezes eu ouço mais pelo solo, não propriamente pela música toda e por isso não é a música da minha vida, no sentido em que é a melhor música da minha vida, mas é a música que tem acompanhado a minha vida.

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