Avenida da Liberdade
Um podcast Renascença para assinalar os 50 anos do 25 de abril de 1974. Nesta terceira série, juntamos quem nasceu antes da Revolução e viveu em ditadura, e quem cresceu em democracia. Cruzamos os olhares de duas gerações para o que fomos, o que somos e o que queremos ser. Avenida da Liberdade é um podcast da jornalista Maria João Costa com sonorização de André Peralta.
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O poder judicial "precisa de ser amplamente reformado" diz Balsemão
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Avenida da Liberdade

Balsemão: O poder judicial "precisa de ser amplamente reformado"

29 abr, 2024 • Maria João Costa


No podcast Avenida da Liberdade, o fundador do PSD considera que Portugal está “muito parado”, é preciso por “mãos à obra”. Numa conversa com a filha Joana Balsemão, o ex primeiro-ministro diz que a morosidade da Justiça não é aceitável.

Continua a ser um social-democrata convicto. Aos 86 anos, Francisco Pinto Balsemão, militante número 1 do PSD diz que a social-democracia “é necessária”.

Em entrevista ao podcast da Renascença "Avenida da Liberdade", o fundador do "Expresso" afirma que “a liberdade e a igualdade não chegam, é preciso também a solidariedade social. São três conceitos que se juntam para que a social-democracia seja viável e necessária”, opina.

Numa conversa conjunta com a filha Joana Balsemão, o ex-primeiro-ministro olha para o atual contexto do país e diagnostica uma paralisia. “Acho que estamos muito parados. Acho que há muito a fazer”, afirma numa entrevista registada nos estúdios de podcast do Expresso.

Pinto Balsemão lamenta que as decisões levem “muito tempo” e dá como exemplo o poder judicial que na sua opinião, “precisa de ser amplamente reformado e capaz de ser mais rápido e eficaz”.

O tempo que as decisões demoram, não é aceitável”, critica o ex-governante apontando também “muita burocracia nas câmaras municipais e nas direções gerais”. Balsemão diz mesmo que a “lentidão é algo que preocupa” e remata que “há muito a fazer cá dentro” e que temos que deitar “mãos à obra”.

“As decisões tomam muito tempo, a burocracia, os atrasos para qualquer coisa andar para afrente continuam a existir. É preciso encontrar mecanismo em que as coisas andem mais depressa e que sejam resolvidas em tempo útil”, refere.

Olhando para um plano mais global, Francisco Pinto Balsemão lamenta que em grande parte do mundo “a democracia é minoritária” e dá como exemplos, a China, a Rússia, mas também alguns da América Latina.

No seu entender também a Europa enfrenta problemas. “A União Europeia tem muito que fazer, e está parada. A sala de espera está cheia. É difícil saber quem é o próximo a entrar”, explica.

Quanto a uma “estratégia de defesa da Europa” considera que é “dificilíssimo conjugar todos os interesses”. Afirma mesmo: “não estou otimista, mas não podemos desistir, temos de continuar a lutar”.

Nascida no ano da primeira constituição, em 1976, Joana Balsemão, embora não esteja envolvida a nível político no ativo, diz-se também, tal como o pai, uma social-democrata convicta.

Depois de ter sido vereadora com a pasta do ambiente na câmara de Cascais durante uma década, a filha de Balsemão considera que as autarquias são “parte da solução” dos problemas do país.

“As autarquias são células administrativas com maior agilidade do que o Estado central. Isso confere-lhes um poder e garra diferentes. O futuro depende muito de como nos ligamos uns aos outros. Como se diminui o fosso entre quem governa e quem é governado” explica.

O dia 25 de Abril de 1974

Foi pela rádio, e, em particular, pela Renascença que Francisco Pinto Balsemão acompanhou as primeiras horas do desenrolar dos acontecimentos do dia 25 de Abril de 1974.

“Soube da notícia, porque me telefonou o Jorge Galamba, pai do ex-ministro Galamba. Às 03h00 ou 04h00 da manhã comecei a acompanhar a Rádio Renascença. Meti-me no carro, e já havia militares em pontos estratégicos”, recorda daquela madrugada.

Francisco Pinto Balsemão era então diretor do semanário Expresso que tinha fundado em 1973. Perante as notícias, meteu-se no carro rumo a Lisboa.

“Fiquei contente quando um dos chefes desses destacamentos militares disse para os outros ‘deixa passar que este é um dos nossos’ e fui para o Expresso”, recorda.

Daquelas primeiras horas, o também jornalista faz questão de referir as diferenças em relação aos dias de hoje quanto à forma como se fazia informação. “As diferenças e dificuldades que os jornalistas enfrentavam para cumprir a sua missão” eram grandes. Era então preciso procurar uma cabine telefónica para fazer chegar ao jornal a informação.

O Expresso só saiu para as bancas dois dias depois. “Não quisemos embandeirar em arco”, explica acrescentando que “foi uma decisão ponderada” e que foi “formidável não ter de mandar nada à censura”, embora reconheça que ainda assim tenham sido “cautelosos”.

Questionado sobre a atual situação dos média, o presidente da holding Impresa SGPS que detém, entre outros a SIC e o "Expresso", diz que “uma empresa privada tem de ganhar dinheiro. Se não ganhar dinheiro não pode ser independente”.

Para Balsemão, é preciso “ir buscar dinheiro a qualquer sítio” para que a empresa funcione. Contudo, alerta para a forma como a “publicidade tem evoluído e tem vindo a ocupar espaço nos media para divulgar os seus produtos”.

Sobre o passado, Joana Balsemão é critica. “O Estado Novo deixou-nos num estado lastimável. Mais de 50% das habitações não tinham água, 40% não tinha retretes, havia lixeiras a céu aberto”, diz a atual responsável de sustentabilidade do Instituto Kaisen.

Na sua opinião, a “União Europeia trouxe avanços” em termos ambientais, refere Joana Balsemão. No entanto, a ex vereadora alerta para o facto de hoje haver “grupos extremistas a usarem as causas ambientais como bode expiatório”.

Questionada sobre a forma como os jovens tem levado a cabo algumas ações climáticas, Joana Balsemão não considera a “fórmula certa”. “Há maneiras construtivas e não construtivas de se manifestarem”, aponta.

Joana dá como exemplo mais positivo o exemplo dos jovens portugueses que puseram “uma ação de justiça climática contra 33 países por considerarem que não estavam a cumprir e que as gerações vindouras eram prejudicadas por isso”.

Sobre a democracia, a filha de Pinto Balsemão diz que esta “tem de se nutrir e reconstruir-se todos os dias”. No seu entender, “infelizmente os portugueses estão muito abaixo na média na confiança nas instituições”. Joana Balsemão considera o facto “muito preocupante”.

São 50 anos de enormes conquistas, mas houve alguma erosão. Há um cansaço e uma descrença. E quanto mais descrença há, mais propensão há para apostar noutros modelos muito perigosos. Vivemos uma policrise", remata.

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