03 mar, 2024 - 20:05 • Tomás Anjinho Chagas
O tema já tinha sido tocado durante os debates para as eleições legislativas, mas este domingo André Ventura deu-lhe um nome. O Chega quer apreender bens de pessoas antes do final do julgamento e colocá-las na economia portuguesa. É a "lei Ventura", cunhada pelo próprio.
Entenda o que envolve esta ideia e o que difere do que se aplica na prática.
O sonho é do líder do Chega e inspira-se em dois momentos políticos que ficaram conhecidas pelos apelidos das pessoas que as desenvolveram: "Lei Cristas" e o "Imposto Mortágua". Uma sobre o descongelamento de rendas antigas, outra que impõe o pagamento de um imposto sobre imóveis.
A "lei Ventura", como lhe chamou o próprio durante um almoço-comício, este domingo em Castelo Branco, pretende "garantir que património dos corruptos era confiscado e que ninguém poderia recorrer abusivamente para evitar ser julgado", resumiu assim o líder do partido.
No fundo, isto permitiria ao Estado confiscar bens de pessoas que estão a ser julgadas e usufruir deles antes de uma ser julgada. "Tal como ocorre nos sistemas anglo-saxónicos uma eficaz apreensão de bens mesmo antes da condenação final e a celeridade conexa do processo em referência", refere o programa eleitoral do partido.
No discurso que fez em Castelo Branco, André Ventura aproveitou o caso de Manuel Pinho no Caso EDP. O antigo ministro da Economia, no governo de José Sócrates, está a ser julgado por ser suspeito de crimes de corrupção, branqueamento e fraude fiscal, e está em prisão domiciliária numa moradia em Braga enquanto aguarda pela decisão final. Ventura defende que essa casa já deveria estar nas mãos do Estado e a ser utilizada.
"A quinta do Manuel Pinho há muito tempo que devia estar ao serviço dos contribuintes portugueses", argumenta o líder do Chega.
Sim. Mas atualmente funciona como uma medida de coação ou uma providência cautelar. Ou seja, trata-se de uma garantia para assegurar que um eventual pagamento de uma multa não fica comprometida.
No fundo, um juiz pode pedir para um determinado bem fique arrestado para servir como caução. No caso de Manuel Pinho, o Ministério Público mandou arrestar a pensão de mais de 20 mil euros.
O que o Chega quer é que o Estado possa utilizar os bens arrestados antes do final do julgamento. Neste momento, ninguém pode ficar definitivamente sem um bem se não for condenado.
André Ventura propõe que isso possa acontecer com suspeitos de corrupção, mesmo que não tenha havido trânsito em julgado, para acelerar o processo.
Nunca foi feito em Portugal. Mas pode violar o princípio da presunção de inocência, garantido pelo 32º artigo da Constituição da República. Ao arrestar bens e colocá-los na economia, como sugere André Ventura, há uma penalização de um cidadão que pode até ser inocente.
No caso de a pessoa ser absolvida, André Ventura sugere que haja uma compensação: "Se houver uma absolvição, haverá uma recompensação. A segunda parte da nossa reforma é permitir a aceleração processual", afirmou o líder do Chega durante uma entrevista ao Expresso em fevereiro.