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Russa, campeã de ténis de mesa, só vinha por um ano. "A verdade é que já passei metade da minha vida em Portugal"

12 abr, 2024 - 10:30 • Carlos Calaveiras

Olga Chramko tem 47 anos, chegou ao Porto em 1998 para jogar ténis de mesa e não tem corrido mal a estadia em Portugal: quatro títulos nacionais. E ainda há tempo para a família e fazer massagens e tratamentos faciais.

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Olga Chramko. Foto: Associação de Ténis de Mesa da Madeira
Olga Chramko. Foto: Associação de Ténis de Mesa da Madeira
Olga Chramko no pódio. Foto: Associação de Ténis de Mesa da Madeira
Olga Chramko no pódio. Foto: Associação de Ténis de Mesa da Madeira

Olga Chramko é campeã nacional de ténis de mesa pelo ADC Ponta Pargo. Aliás, tetracampeã uma vez que venceu o título em 2016, 2018, 2020 e 2024. É russa, tem 47 anos. Vinha por um ano, mas está há quase 30 anos em Portugal.

Comecemos pelo princípio, como surgiu o amor pelo ténis de mesa?
Foi fácil. Chegou uma treinadora nova à minha escola para as aulas de educação física. Eu tinha 9 anos e fui escolhida. Comecei a ir aos treinos, primeiro três vezes por semana e depois os treinos tornaram-se mais sérios, todos os dias

Era um desporto popular na sua zona ou tem alguém na família que lhe meteu o bichinho?
Na família ninguém jogava e não era o desporto principal. Na Rússia, futebol, atletismo, voleibol, basquetebol têm maior popularidade. Mas na minha cidade [Nalchik, região do Cáucaso do Norte, República Kabardino-Balkaria] há uma boa escola de ténis de mesa. Já saíram uma medalha de bronze de juniores num campeonato da Europa e também uma medalha num campeonato do Mundo feminino. Ainda na altura da União Soviética, o Estado pagava todas as despesas com estágios, torneios e campos de férias.

Entrou cedo em competições? Percebeu logo que tinha jeito?
O meu primeiro torneio foi aos 10 anos. Tive de trabalhar muito para conseguir resultados. Só da minha idade havia 15 meninas na escola e senti muita concorrência.

Como se dá a mudança para Portugal?
Quando a União Soviética se separou, essa altura não foi fácil. Houve uma crise económica e quando acabei a Universidade tive algumas dificuldades em encontrar trabalho na Rússia e pensei: ‘O que vou fazer?’ Recebi a proposta de um clube do Porto e aceitei o desafio. Pensei: ‘Vou fazer uma época, conhecer Portugal, aprender a língua e depois voltar para a Rússia’. A verdade é que já passei metade da minha vida em Portugal.

Quando é que chegou?
Cheguei ao Porto em 1998. Depois joguei algumas épocas na zona de Penafiel e também já estive em Mirandela antes de vir para a Madeira, onde já estou há cerca de 20 anos.

Já tem quatro títulos nacionais em Portugal (2016, 2018, 2020, 2024). Está a correr bem
Sim, está a correr bem. Consigo conciliar a vida familiar e o trabalho com o desporto. Tento participar em todos os campeonatos nacionais, nem sempre consigo ganhar porque o nível do ténis de mesa em Portugal subiu muito e não é fácil lutar com as jovens que estão a aparecer, a jogar bem e já fazem estágios em países asiáticos. Mas é bom para mim e para as mais novas.

Por falar nisso, neste último título defrontou atletas muito novas, 15 e 19 anos, por exemplo. O futuro do ténis de mesa luso está garantido?
Penso que sim. Vamos ter de certeza [boas jogadoras]. As atletas aplicam-se a 100%, treinam nos limites máximos, têm talento, têm inteligência. Estou muito otimista.

Há algum atleta português a quem veja grande potencial?
Já podemos estar orgulhosos com o madeirense Marcos Freitas, que já conseguiu resultados históricos e a jogar a muito bom nível. Em relação aos mais novos Tiago Lee, Gonçalo Gomes, Marco Rodrigues, o Sardinha... Ao nível dos femininos podia estar melhor. Estamos com um bom nível sub15 e sub13.

A seleção feminina é 11.ª do mundo. Tem estado entregue nos últimos anos à Fu Yu e à Jieni Shao e com bons resultados, apesar de agora terem falhado a qualificação coletiva para os Jogos Olímpicos.
Falharam a qualificação por equipas, mas ainda está em aberto a qualificação de atletas na qualificação individual. Mas acredito que nos próximos Jogos Olímpicos a equipa vai conseguir a qualificação.

Tem 47 anos, a idade já pesa?
Pesa, mas não muito. Para deixar de jogar na primeira divisão só quando sentir dificuldades e o meu corpo disser ‘chega’. Por enquanto, consigo aguentar os jogos e ter bons resultados.

É possível ser profissional de ténis de mesa em Portugal?
É possível, sim. Há jogadores profissionais que fazem treinos bi-diários, mas eu sempre gostei de fazer outras coisas, além de desporto. Ajuda a sair da rotina desportiva e a não ficar – especialmente quando as coisas não correm bem – focado nas coisas más.

E o que faz?
Estou a colaborar com um hotel como terapeuta de Spa. Faço massagens e tratamentos faciais. Gosto desta profissão.

Já lhe passou pela cabeça servir a seleção nacional?
Já fiz parte como jogadora e também ajudo nas provas internacionais como treinadora, quando tenho tempo. É uma área interessante e sinto que posso ajudar os mais novos.

O Governo Regional da Madeira aprovou voto de louvor. É um reconhecimento importante, imagino?
Claro que sim. Estou bastante agradecida. Penso que o governo regional está a fazer um bom trabalho ao nível do desporto. Claro que precisávamos mais um bocadinho para os clubes da Madeira, mas sabemos a nossa realidade e a dificuldade das finanças.

A fechar, permita-me uma pergunta fora do tema ténis de mesa. É russa, a atual situação da Rússia e a guerra com a Ucrânia merece-lhe algum comentário?
É uma tristeza para os dois povos. Tenho amigos na Ucrânia, amigos e familiares na Rússia. É um pesadelo e apetece acordar e pensar que não é verdade o que se está a passar.

Sou russa, estou grata e não viro as costas ao país, mas considero que falharam todos: falhou o governo ucraniano que não conseguiu criar um bom relacionamento com o país vizinho, falhou o governo russo que chegou a este ponto e falhou a Europa que poderia ajudar mais. Certo é que quem está a sofrer é o povo. Espero que esta situação acabe rapidamente.

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