Legislativas 2024

O “novo” parlamento esmiuçado: Como se renovou a Assembleia da República?

12 mar, 2024 - 19:45 • Salomé Esteves

Dos 226 parlamentares eleitos até agora, 95 vão manter o assento. Alguns trocaram de círculo eleitoral para segurar o estatuto de deputado. Como vão ficar as bancadas parlamentares depois de perdida a maioria absoluta do PS?

A+ / A-

A Assembleia da República tem 230 assentos. Mas depois das eleições deste domingo, com os 226 deputados já eleitos, vai ter uma disposição bastante diferente. Com a perda da maioria absoluta do PS (regressando a bancada socialista à casa dos setenta) e o crescimento exponencial do Chega, há 131 caras “novas” e 95 rostos que se mantêm.

Quem se estreia, quem fica e quem se despede do Parlamento? A Renascença esmiúça os detentores dos assentos que já se conhecem.

Os quatro deputados que faltam, eleitos eleitos pelos círculos do estrangeiro, serão conhecidos depois da contagem desses votos, a 20 de março.

Aliança Democrática está lavada de fresco, com um pingo de CDS

A Aliança Democrática elegeu 79 deputados no último domingo, incluindo dois do CDS e três do Madeira Primeiro (coligação entre os dois partidos naquele arquipélago). Em 2022, o PSD elegeu 76, o CDS nenhum e o Madeira Primeiro os mesmos três.

Ainda que o crescimento tenha sido residual, a renovação foi intensa.

Dos 79 conhecidos até agora, apenas 18 se mantêm. Dez foram eleitos pelo mesmo círculo e na mesma posição que em 2022 e oito mudaram de posição dentro da lista — metade destes foram promovidos.

Jorge Paulo Oliveira subiu um lugar em Braga. Germana Rocha saltou de número 10 para número três no Porto e, na mesma lista, Andreia Neto subiu do 13 para o seis. Joaquim Miranda Sarmento, eleito líder parlamentar do PSD em julho de 2022, subiu dois lugares em Lisboa e é, agora, número dois.

Em oito listas da AD, há uma total renovação dos deputados eleitos. É o caso de Bragança, Coimbra, Guarda, Setúbal, Vila Real, Viseu e Madeira. Mas em Aveiro, onde conseguiu sete mandatos, apenas uma candidata se mantém. Lisboa segura dois nomes, incluindo o líder parlamentar, e o Porto segue com três dos mesmos deputados que elegeu em 2022.

Nuno Melo regressa, tal como o próprio CDS, ao Parlamento. O ex-deputado foi eleito pela Aliança Democrática como número dois no círculo eleitoral do Porto. Já Paulo Núncio —que durante a campanha foi criticado por todos os partidos por defender que a reversão da “liberalização da lei do aborto passa por um novo referendo” — assegurou um lugar no Parlamento por ser o quarto candidato da coligação por Lisboa.

Gonçalo da Câmara Pereira, líder do PPM, a terceira força política que compõe a coligação, era o número 19 por Lisboa e não foi eleito. Em jeito de comparação, nas legislativas de 2019 o PS conseguiu, com maioria absoluta, eleger 19 deputados em Lisboa.

Nas listas definitivas publicadas pela CNE, constavam seis candidatos independentes pela Aliança Democrática. Dois foram eleitos deputados. O primeiro é número quatro pelo Porto, Óscar Afonso, que se estreia no Parlamento.

O segundo independente eleito pela AD é o cabeça de lista por Santarém, Eduardo Oliveira Sousa, o único rosto novo no círculo eleitoral — que também gerou discussão durante a campanha por declarar que Portugal tem perdido investimento por “falsas razões climáticas”, alertando para o perigo da organização de milícias armadas perante “os roubos nos campos”.

Partido Socialista não renova todos, mas diz adeus a alguns

O Partido Socialista foi a força política que mais deputados perdeu neste domingo. Eram 120, são agora 77 os parlamentares com assento na nova legislatura.

No círculo eleitoral de Aveiro, todos os nomes se mantêm e apenas um se moveu. Hugo Oliveira foi promovido de número seis a número quatro para substituir Porfírio Silva. Em Beja (onde perdeu um mandato), Nelson Brito, que foi o número dois em 2022, foi eleito como cabeça de lista este ano.

Braga mantém José Luís Carneiro como cabeça de lista e assegura Palmira Costa como número dois. O resto do grupo é renovado. A par do círculo eleitoral minhoto, é Lisboa o que mais renova.

Ana Abrunhosa trocou Castelo Branco por Coimbra, porque Marta Temido abandonou o posto para ser o número quatro por Lisboa. A substituição surge depois de Duarte Cordeiro não ter aceitado fazer parte das listas por ter sido envolvido na Operação Influencer, ainda que não tenha sido arguido no processo. Segundo o Público, "o número dois de facto de Pedro Nuno Santos” terá apenas concordado em integrar o secretariado do PS.

Também Eurico Brilhante Dias subiu um lugar na lista pelo círculo eleitoral de Leiria e agora foi eleito, em substituição de António Lacerda Sales, que não vai voltar ao Parlamento como deputado do PS.

Não é o único. Há várias figuras do Partido Socialista a dizer adeus à bancada entre as duas eleições. Dos ministros que serviram na última legislatura, abandonaram as listas do PS (e, portanto, não foram eleitos como deputados) João Gomes Cravinho, Maria do Céu Antunes, Catarina Sarmento e Castro e João Galamba.

Também há três ministros de governos socialistas anteriores que não renovaram a sua candidatura nas listas do PS entre 2022 e 2024: Tiago Brandão Rodrigues, Luís Capoulas Santos e João Pedro Matos Fernandes. Os três tinham sido deputados na última legislatura, mas não foram candidatos para 2024.

Além destes, nove secretários de Estado também não vão regressar, por não serem candidatos ou por não terem sido eleitos: Hugo Polido Pires, João Sobrinho Teixeira, Berta Nunes, João Paulo Catarino, Ana Sofia Antunes, Maria de Fátima Fonseca, Miguel Cabrita, Jorge Seguro Sanches e Isabel Almeida Rodrigues.

Quem também não está de regresso é Nuno Fazenda, nomeado por António Costa como presidente da subcomissão parlamentar para o acompanhamento dos fundos comunitários e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Da mesma maneira que há quem saia, há também quem a casa torne. Francisco Assis regressa ao Parlamento treze anos depois, após ter ocupado o cargo de presidente do Conselho Económico e Social (CES) durante três anos (cargo que abandonou para encabeçar a lista do PS pelo Porto).

Também no Porto surge Manuel Pizarro em terceiro lugar. O mais recente ministro da Saúde, que substituiu Marta Temido, é o número três na lista. Ainda que não tenha sido candidato pelo PS em 2022, chegou a integrar a bancada socialista entre 2005 e 2013.

O Chega entra em peso no Parlamento, mas sem mudanças drásticas

Depois de uma vitória histórica e de ter juntado 36 deputados à sua bancada, o Chega mantém na Assembleia da República quase todos os deputados eleitos em 2022, nas mesmas posições em que foram eleitos da última legislatura.

A única exceção é Rita Matias que, em vez de ter sido eleita como número três pelo círculo eleitoral de Lisboa, chega ao Parlamento como cabeça de lista por Setúbal.

Até à troca, o primeiro lugar por Setúbal era ocupado por Bruno Nunes, que tinha sido o único eleito por esse círculo eleitoral em 2022. Mas, nestas eleições, Nunes concorria como número sete por Lisboa.

O deputado e antigo vereador da Câmara de Loures foi a única despromoção do Chega entre eleições legislativas — tendo em conta que o partido elegeu quatro deputados por Lisboa em 2022 e, em sétimo lugar, estava no limiar da eleição. Segundo declarações ao Observador, a situação não foi, nem para o partido nem para o deputado, “despromoção nenhuma, mas sim uma estratégia”.

Há a registar também o fluxo de transferências externas. Cristina Rodrigues, eleita deputada em terceiro lugar pelo Porto, regressa ao Parlamento pela segunda vez. Em 2019, foi eleita pelo PAN mas, em 2020, passou ao estatuto de deputada não-inscrita, antes de trocar de partido.

Mas o grande grupo de dissidentes vem do PSD. Eduardo Teixeira, Henrique Freitas (secretário de Estado no governo de Durão Barroso), Manuela Tender, Sandra Pereira e Rui Cristina saltaram para o Chega e todos chegaram a ser deputados pelos sociais-democratas. O último passou a deputado não-inscrito a 24 de janeiro de 2024, quando o Governo já estava em gestão e o Parlamento dissolvido.

João Tilly, eleito por Viseu, não chegou a ser deputado pelo PSD, mas foi assessor de comunicação do grupo parlamentar. O mesmo aconteceu com Bruno Pessanha, que foi exonerado do cargo em janeiro de 2016. Diva Ribeiro chegou a ser militante do PSD, mas não exerceu cargos dentro do partido.

Há sete deputados, eleitos como cabeças de lista, que não pertenciam às listas do Chega em 2022: Diva Ribeiro (Beja), Rui Cristina (Évora), Carlos Melo (Guarda), Henrique Freitas (Portalegre), Eduardo Teixeira (Viana do Castelo), Francisco Gomes (Madeira) e Miguel Arruda (Açores).

João Ribeiro, eleito por Castelo Branco, já era o cabeça de lista pelo Chega no círculo eleitoral em 2022, mas não foi eleito. Eliseu da Costa Neves, eleito como número dois por Coimbra, também já figurava nas listas de 2022, mas em quarto — e, novamente, não foi eleito.

João Graça e Sandra Ribeiro, eleitos como número dois e número três em Faro, já preenchiam esses lugares nas listas do Chega nas legislativas de 2022. Tal como o número dois por Leiria, Luís Fernandes.

Felicidade Alcântara, eleita como número seis em Lisboa, pertencia à mesma lista do partido em 2022, mas em 16.º lugar, da mesma maneira que José Soares, último eleito, em número nove, era o 20.º candidato em 2022. Já Marta Trindade, Ricardo Blaufuks e Madalena Cordeiro não figuravam na lista nas últimas eleições.

Entre os eleitos pelo Porto, Marcus Santos e Sónia Monteiro já pertenciam à lista do partido nas legislativas de 2022, mas Maria Rodrigues, José Carvalho e Raúl Melo não.

Pedro Correia, que entra no Parlamento como número dois por Santarém, já era o número dois do distrito em 2022, mas Luísa Macedo não fazia parte da mesma lista.

Em Setúbal, todos os nomes são novos, com exceção de Patrícia Carvalho, que mantém a segunda posição.

Iniciativa Liberal segura oito lugares com micro mudanças

O partido liderado por Rui Rocha mantém praticamente o grupo parlamentar que tinha na última legislatura e o mesmo número de deputados — ainda que tenha perdido um assento em Lisboa. Há duas entradas e duas saídas.

Mariana Leitão vai estrear-se no Parlamento, depois de ter sido eleita como número dois pelo círculo eleitoral de Lisboa. Em 2022, era o número oito pela mesma lista.

O outo estreante é Mário Amorim Lopes, eleito pelo círculo eleitoral de Aveiro — mandato que a IL conquista pela primeira vez.

Mas há uma alteração de posição. Bernardo Blanco foi eleito em 2022 em quarto lugar por Lisboa, mas este ano substituiu João Cotrim de Figueiredo como líder do maior círculo eleitoral do país.

O antigo líder do partido é cabeça de lista pela Europa e é provável que abandone o Parlamento, já que os mandatos do estrangeiro são historicamente atribuídos ao PS ou ao PSD, agora em coligação.

Carla Castro foi eleita deputada por Lisboa nas últimas eleições. Mas, depois da uma sucessão de problemas internos que culminaram na sugestão de que seria o número sete na lista do círculo eleitoral nestas legislativas, acabou por desvincular-se do partido.

Bloco de Esquerda mantém três e renova dois

Dos cinco deputados eleitos pelo Bloco de Esquerda, três regressam ao Parlamento nas mesmas posições que ocuparam na última legislatura. Mariana Mortágua já tinha sido eleita como cabeça de lista por Lisboa e a irmã, Joana Mortágua, pelo mesmo estatuto, mas em Setúbal. José Soeiro foi novamente eleito como número dois pelo Porto.

Ao contrário de 2022, não segue Catarina Martins, que renunciou ao cargo de deputada em setembro de 2023, mas Marisa Matias. A eurodeputada e antiga candidata às presidenciais pelo Bloco de Esquerda chegou a encabeçar a lista do BE por Coimbra nas últimas legislativas, mas não tinha sido eleita deputada.

Fabian Figueiredo, o novo número dois por Lisboa, vai estrear-se no Parlamento, em substituição de Pedro Filipe Soares. O líder parlamentar do BE abandona a Assembleia depois de 15 anos como deputado.

CDU perdeu dois deputados, um círculo, mas tem um regresso histórico

Dos quatro deputados eleitos pela CDU nestas eleições legislativas, que vão ocupar os assentos do PCP, a única que se mantém é também a única mulher e líder da bancada parlamentar. Paula Santos foi eleita como cabeça de lista de Setúbal — mas aí o partido perdeu o número dois da lista, Bruno Dias.

Paulo Raimundo seguiu as passadas de Jerónimo de Sousa — não só como líder do partido, mas como cabeça de lista por Lisboa. O antigo secretário-geral comunista abandonou o Parlamento em novembro de 2022, dez meses depois das últimas eleições para a Assembleia da República.

Mas o Partido Comunista tem um histórico está de volta. Dois anos depois, António Filipe regressa ao Parlamento.

Depois de não ter sido eleito deputado em 2022 pelo círculo eleitoral de Santarém, o professor universitário mudou-se para o círculo eleitoral de Lisboa, onde a CDU conseguiu dois mandatos. António Filipe foi deputado em todas as legislaturas desde 1989, com exceção da última.

Alfredo Maia, cabeça de lista pelo círculo eleitoral do Porto, também regressa ao Parlamento. Apesar de não ter sido eleito deputado em 2022, o antigo presidente do Sindicado dos Jornalistas substituiu a deputada Diana Ferreira na Assembleia da República, em setembro desse ano.

O PCP acabou por perder o último deputado por Beja neste domingo. João Dias, o único que os eleitores mantiveram em 2022, era deputado do PCP por esse círculo eleitoral desde 2015. Já em 2022 os comunistas tinham perdido o único deputado por Évora, João Oliveira.

Livre cresce com uma fundação antiga

O Livre foi o segundo partido que mais cresceu e constituiu um grupo parlamentar, agora com quatro deputados. Além de Rui Tavares, que mantém o assento na mesma posição, junta-se Isabel Mendes Lopes, também eleita pelo círculo eleitoral de Lisboa. Já em 2022, Isabel preenchia o mesmo lugar nas listas.

O partido também elegeu, pela primeira vez, no Porto e em Setúbal. Tanto Jorge Pinto como Paulo Muacho eram cabeças de listas pelos seus círculos eleitorais, respetivamente, nas últimas eleições.

Os três novos deputados do Livre já integram o partido desde os seus primeiros anos, entre 2014 e 2015.

No PAN, nada de novo

À semelhança do que aconteceu em 2022, o PAN consegue um mandato em Lisboa. Inês Sousa Real, líder do partido, voltou a ser eleita como cabeça de lista pela capital.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+