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Vigília pela Palestina recorda a "Nakba" e saúda a "solidariedade dos povos"

16 mai, 2024 - 00:23 • Lusa

A vigília foi convocada pela Plataforma Unitária em Solidariedade com a Palestina (PUSP) em Lisboa, e não longe da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

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Várias centenas de pessoas juntaram-se esta quarta-feira numa vigila pela Palestina num jardim de Lisboa, um movimento de solidariedade "contra a guerra e o genocídio" que se pretende permanente e contrarie a "inação dos "governos do mundo".

No jardim Amélia Carvalheira, centro de Lisboa, nas traseiras da Igreja da Nossa Senhora do Rosário de Fátima, balões vermelhos com o nome de aldeias destruídas e um pequeno panfleto estão presos a troncos de árvores e recordam os acontecimentos de 1948, a Nakba (Catástrofe em árabe) evocada no seu 76º aniversário.

Desta forma, recordou-se expulsão de suas casas e terras de cerca de 750.000 palestinianos antes de após a fundação do Estado de Israel em 1948, que coincidiu com a primeira guerra israelo-árabe. Misca, 1848; Sabalan, 1948; Al-Manaba, 1948... Os nomes de algumas das dezenas de povoações arrasadas.

Pelo jardim, a par de muitos jovens ativistas, também presentes músicos poetas, pintores. Lá estão João Reis, Rita Blanco, Dalila Carmo ou Isabel Abreu.

"Não podemos continuar a assistir aquele genocídio, aquela mortandade, chamem o que quiserem. Crianças inocentes, mulheres, a serem mortas por aquele criminoso, por aquele ditador, e com o apoio dos europeus e dos Estados Unidos, todos a fingirem que "sim, mas também...", e ninguém se assume", disse à Lusa a atriz Rita Blanco, junto aos amigos.

No relvado, duas grandes bandeiras da Palestina. Muitos e muitas com "keffiyeh", o lenço palestiniano. Uma faixa também junto à relva: "Fim à agressão, por uma Palestina livre e independente".

A vigília foi convocada pela Plataforma Unitária em Solidariedade com a Palestina (PUSP) em Lisboa, e não longe da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde decorre uma ocupação de instalações impulsionado pelos jovens ativistas pelo clima, à semelhança do que sucede na Faculdade de Belas-Artes, em solidariedade com a Palestina e pela instauração de um cessar-fogo duradouro.

"Não podemos continuar a ver as imagens no Instagram e normalizar a violência. Já aconteceu, e acontece nas redes sociais. A banalização do mal, como dizia Hannah Arendt", prossegue Rita Blanco.

"Já vimos todo o horror e continuamos impávidos e serenos à espera de que quê? Não sei o que se pode fazer, mas ei que pelo menos não quero ficar em casa, não quero ficar com esse peso na consciência".

Dima Mohammed, académica e ativista, foi uma das intervenientes neste protesto solidário que manteve o formato de "microfone aberto". Regressou recentemente de Ramallah, na Cisjordânia, onde nasceu. .

"O que está a acontecer é uma enorme dor", disse nas suas declarações à Lusa.

"É a nossa dor mas também há muito medo, dos ataques muito violentos e descontrolados dos colonos. Em Ramallah não existe uma única casa que seja segura. A construção dos colonatos foi feita de uma forma para facilitar que qualquer colono tenha possibilidade de matar uma pessoa em sua casa. E Ramallah é dos locais mais seguros".

Nesta sua recente passagem por Ramallah, Dima Mohammed sentiu também uma "fonte de esperança", partilhada pela população palestiniana.

"A única fonte de esperança que senti relaciona-se com os movimentos estudantis no mundo. Toda a gente falava nisso, todos os dias se fala das novas universidades onde aconteceu mais um acampamento. Está a ter um grande impacto na Cisjordânia, porque os governos do mundo estão a deixar que Israel faça o que quiser".

A esperança de que "os povos do mundo se movam", numa situação quase limite e que sugere sentimentos díspares.

"Na Palestina senti as duas coisas, o abandono dos governos do mundo mas também a solidariedade dos povos. E temos esperança nisso. As conversas denunciam um medo profundo, mas não querem falar do medo. Mas depois a conversa muda para se falar dos estudantes do mundo. Estava lá no sábado passado, houve manifestações pelo mundo, e as pessoas partilhavam nas redes sociais os protestos", conta a ativista palestiniana.

"Há esperança que este fosso entre os povos e os governos do mundo vai finalmente ser resolvido. É a única esperança para a nossa Palestina. A cumplicidade dos governos é vergonhosa, mas a solidariedade dos povos é a única fonte de esperança".

A esperança que tenta contrariar as profundas sequelas de um conflito que parece não ter fim, tal como a hipotética solução de "dois Estados".

Após a sua vitória militar em 1948 Israel proibiu o regresso dos deslocados e refugiados, porque implicaria numa maioria de população palestiniana no interior das suas fronteiras. Pelo contrário e até à atualidade, após sucessivas gerações, seis milhões de palestinianos permanecem instalados em campos de refugiados na Jordânia, Líbano, Iraque, Síria, ou nos territórios da Cisjordânia ocupada por Israel.

Já em Gaza, os refugiados e seus descendentes constituem cerca de 75% dos 2,4 milhões de habitantes. E de acordo com uma estimativa da ONU divulgada na terça-feira e baseada nos números do ministério da Saúde do governo do Hamas em Gaza, pelo menos 50% a 60% dos mais de 35.000 palestinianos mortos no enclave pelas forças israelitas são mulheres e crianças.

Todos estes números, todos estes dados, pareciam presentes nas mais de 200 pessoas presentes na vigília, um protesto que se tem alargado pelo país.

"No Porto, há vigílias todos os dias, em Lisboa e Braga todas as quartas-feiras", esclarece Júlia Branco, 23 anos, uma das organizadoras desta iniciativa.

"O que se passa em Gaza e na Palestina é um crime enorme que afeta os que lá estão e todo o mundo. É o auge de todas as opressões que existem no mundo", assinala.

"Israel está a cometer um genocídio em Gaza e é nossa responsabilidade enquanto pessoas com direitos e liberdade de expressão fazer o máximo. Incluindo pressão política, para que os nossos representantes também façam alguma coisa. É necessário continuar até a Palestina ser livre. É um dever nosso", frisa, com convicção.

Perto, numa banca, a poeta e cineasta palestiniana Dima Akhram, está atarefada rodeada por participantes que procuram um "keffiyeh, ou "pins" solidários.

"Há duas opções, ou a comunidade internacional toma uma posição para a defesa da lei internacional, em que todos devem ser iguais face à lei, ou o caos vai prosseguir e vão acontecer situações piores que as atuais", vaticina à Lusa.

Nesse momento, já se começavam a entoar cânticos, acompanhados por palmas: "Abaixo o sionismo, vai cair, vai cair / e viva a Palestina a resistir, a resistir".

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