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Avenida da Liberdade

José Pedro Castanheira: “Há uma hipótese de regresso ao passado”

13 mai, 2024 - 07:30 • Maria João Costa

A liberdade é o “pão” do seu espírito. José Pedro Castanheira tornou-se jornalista a seguir ao 25 de Abril de 1974. Em entrevista conjunta com o seu filho Pedro, ao podcast Avenida da Liberdade, mostra-se preocupado com o futuro dos média em Portugal. Já Pedro Castanheira está apreensivo com o avanço do “deserto” no Alentejo.

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“Há uma hipótese de um regresso ao passado”, diz José Pedro Castanheira ao podcast Avenida da Liberdade com que a Renascença assinala os 50 anos do 25 de Abril de 1974. O jornalista que foi entrevistado em conjunto com um dos filhos, Pedro Castanheira, considera que “Portugal está cheio de tensões internas e isso é muito negativo”.

Na sua opinião, há hoje um “défice enorme de informação e formação”, mas isso, reconhece José Pedro Castanheira é “responsabilidade” da sua geração, para quem a “liberdade é vital”.

“Não saberia viver sem liberdade, já tinha dificuldades em viver sem liberdade antes de a ter. É o pão do meu espírito”, aponta o repórter.

Num olhar crítico, o seu filho Pedro nascido já em democracia questiona-se sobre uma “democracia que tem 50 por cento de abstenção, e onde quase metade do país não participa”.

Para Pedro, a abstenção “deixa-nos muito sujeito a movimentos populistas”. O músico que fala do “perigo” dos populismos indica que “o problema da liberdade é quando a tomamos como garantida e não a exercitamos da melhor maneira”.

“A democracia e a liberdade não são uma finalidade, mas sim o início de alguma coisa, e isso é o mais importante de perceber”, diz Pedro Castanheira.

Questionado sobre a crise atual nos media, o jornalista José Pedro Castanheira diz que olha de “forma muito pessimista” para o que está a acontecer.

Não sei que órgãos de comunicação social irão sobreviver a médio prazo, em Portugal”, interroga-se. “Estamos numa espécie de limbo, mas quero acreditar que a informação resistirá a este fenómeno das redes sociais que ilude muita gente”, refere José Pedro Castanheira.

Aos 43 anos, Pedro Castanheira vive no Alentejo. Embora já tenha vivido fora, preferiu regressar ao território português e com isso afinou o seu olhar crítico para o que se vive naquela região.

“Eu não fiquei por orgulho nacional ou patriótico. Portugal tem um privilégio imenso. Eu gosto muito da natureza, vivo no meio da natureza!”, explica.

Interrogados sobre o que seria revolucionário hoje, José Pedro Castanheira, diz aos 71 anos que se dava por “satisfeito se houvesse um respeito pelas opiniões uns dos outros, sem agressões, com pluralismo e tolerância”.

Já Pedro Castanheira que diz morar “na muralha do castelo que está a ser atacado pelo deserto”, lembra que os especialista indicam que daqui a 20 anos, “80 por cento do sul de Portugal desaparecer em biodiversidade”, por isso remata, “revolucionário em Portugal era perceber quais são as prioridades, assumir como prioritário o equilibro ecológico”.

“Posso me preocupar com mil e um regimes políticos, programas, orçamentos e ideologias. Tudo isso é muito válido, mas se os meus filhos viverem num deserto daqui a 20 anos, nada disso vale! Por isso revolucionário agora seria dar prioridade ao que implica a sobrevivência das espécies”.

“25 de Abril modificou completamente a minha vida”

José Pedro Castanheira recorda que no dia antes da Revolução fez aquele que foi o seu último exame do curso de Economia que nunca viria a terminar.

Estava no quarto ano de Economia, com a meta à vista, e o meu último exame foi no dia 24 de abril. Era de Direito Corporativo e do Trabalho. Nunca mais fiz nenhum exame no curso. Deixei de frequentar as aulas”, lembra o agora jornalista que afirma: “O dia 25 de Abril modificou completamente a minha vida”.

Vivia então em Cascais, em casa dos pais, com os seus oito irmãos. No dia 25 de Abril ficou “em casa como quase todos os portugueses”, relata ao Avenida da Liberdade. Admite que “a autoridade paterna fez-se exercer”, e que só no dia 26 de abril rumou a Lisboa.

Mas a “madrugada inicial e limpa”, como lhe chamou a poeta Sophia de Mello Breyner não apanhou Castanheira de surpresa. “Já estava à espera de alguma coisa, porque pertencia à Juventude Universitária Católica, por onde tinham passado muitos dos comunicados pelo Movimento dos Capitães”.

Na memória do jornalista está a data do Golpe das Caldas. “Foi nesse dia que percebemos que havia alguma coisa, e, cinco semanas depois, aconteceu o 25 de Abril!”

Do dia da Revolução guarda na memória o “som que saía do Rádio Clube”. “Percebi pelo som que não era uma coisa de um movimento de direita. De repente passamos a ouvir música de José Afonso, Manuel Freire, Sérgio Godinho. Quem usa a música de José Afonso está a dar aos seus ouvintes um sinal claro”, conta.

Nunca mais voltou à faculdade e “em agosto já estava a trabalhar nos jornais”, conta recordando: “O meu pai nunca me perdoou não ter acabado o curso!”. José Pedro Castanheira admite que sentia já “um apelo a ter uma intervenção cívica, cultural”.

Começou no jornal “Povo Rural”, passou pelo diário “A Luta”, antes de chegar ao Expresso. Recorda que então se fazia “um jornalismo muito diferente, muito militante e de causas vividas intensamente”.

Orgulhoso do pai que tem, Pedro Castanheira que nasceu 6 anos depois do 25 de Abril lembra-se em particular dos anos 1980 em que “havia ainda um rebuliço revolucionário. As pessoas ainda tinham um sonho pelo futuro”.

Assume-se como um filho dos “novos horizontes”, músico de formação Pedro Castanheira lamenta que a música tenha perdido terreno. “A música não tem de ser política ou ter causas sociais, mas a maneira como as pessoas interagiam, ouviam e sonhavam a música é algo que não encontro com tanta facilidade”.

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